Amar quando menos merecer
Ninguém é perfeito, diz a máxima que todo mundo repete e no entanto não sabe aplicar. Quando o assunto é maternidade a coisa fica ainda mais catastrófica.
O mundo facebookiano fez com que as pessoas e seus filhos parecessem mais perfeitos, mais bonitos. Através da comparação ilusória, nos sentimos mais feios e inadequados. Na ilha de edição que só mostra a parte bela da vida (ao contrário dos noticiários), nossa vida feita de luz e sombra parece fora de esquadro.
Um amigo uma vez me disse algo que refleti profundamente: “quando alguém posta algo na Rede Social não deseja mostrar a felicidade apenas, mas também despertar a inveja”.
A inveja e a inadequação crescem no coração. Aquela mãe com o filho que não dorme, que mama o dia todo, que mal tem tempo de fazer coco sem interrupção sente aquele sentimento: não é tão bom ser mãe assim.
Junto com tudo isso a culpa cresce por dentro do peito. O sonho de ser mãe, ter um filho fisicamente perfeito não basta.
Em um mundo que vive de aparências, espera-se que as pessoas, as crianças sejam perfeitas. Algumas vezes a outra máxima “o mau é bom e o bem, cruel” também faz sentido na terra da maternidade de verdade.
Uma criança que dorme a noite inteira, por exemplo, algumas vezes treinada para tal com técnicas como Nana Nenê, acostuma-se com a negação de suas necessidades primais, passa a não solicitar os cuidadores. Aparentemente é uma criança calma que dorme a noite inteira.
O fato, como estudaram alguns cientistas como Marcy Axness, é que esta criança sabe que seus sentimentos e necessidade não foram legitimados. A dor dessas feridas podem ser mais profundas e com mais ramificações do que se pode imaginar.
Claro que temos que pesar as nossas necessidades também. Uma amiga uma vez me disse: melhor uma mãe feliz com NAN do que uma mãe destruída que amamenta. Salvo raras exceções muitas vezes o que se vê, como lindamente mostra Laura Gutman, no livro Maternidade e o Encontro com a Própria Sombra, é que esta mulher pode não estar recebendo o apoio necessário para que possa amamentar.
Sem comer direito, sem dormir, tendo que cuidar da casa e de outras demandas físicas e emocionais próprias, de outros filho e membros da família, sobra pouca energia e entrega para a produção de leite.
Assim como a maioria das mães deseja parto normal (70%, como mostra essa pesquisa da Fiocruz), a maior parte das mulheres sonha em amamentar. Mas nem sempre conseguem, pelos fatores mencionados anteriormente.
Diante de uma mamadeira, de uma criança que não dorme, de um filho birrento, de uma criança que não come, de um ser que saiu de você, feito com seu amor e criado com todo carinho que é capaz de bater em outras crianças, diante da maldade explícita de seu filho, bate aquela culpa. Aquele nó na garganta e a frase: o que eu fiz de errado?
Quem nunca se perguntou isso? Eu, inúmeras vezes. Acontece que, vou te contar um segredo: filhos são os melhores espelhos para que possamos aprender mais sobre nós mesmas. Muitas vezes eles evidenciam características nossas que não aceitamos.
Fácil é amar o bonito, o perfeito. Difícil é amar o feio, o sombrio. Quando conseguimos amar nossos filhos apesar de nossas expectativas, amando o que realmente são uma mágica acontece.
Apenas quando conseguimos aceitar e integrar essas características negativas ao amor, sem querer excluí-las, é que conseguimos realmente ajudar este ser a crescer físico e emocionalmente.
Com isso crescemos também porque aprendemos a amar nossas partes feias e ressecadas que precisam, algumas vezes de lágrimas para que possam se entregar a nossa essência.
Filhos são mestres em promover lágrimas: de alegrias e de tristezas. Mas a grande maestria deles é de nos fazer crescer.
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